terça-feira, 27 de julho de 2010

Beit Hamikdash

A CASA DE DEUS
Valdemilson Liberato

    Todos nós, cristãos, aprendemos que somos, em Cristo, “Templo” do Deus vivo. (1Co 3.16-17; 2Co 6.16; Ef 2.21) Ou seja, a Igreja, isto é, o povo de Deus - judeus e gentios que confessam e seguem Yeshua (Jesus) como Messias, o Filho do Deus vivo - é comparado a um edifício, ou melhor, representa, individualmente, o próprio santuário de Deus no mundo. Mas será que temos a real compreensão do que esta "figura de linguagem" significa? Do grau mínimo de santificação que deveremos buscar para chegar a ser reconhecido como morada do Espírito Santo?
    Veremos a seguir, no artigo publicado pela revista MORASHÁ (Junho 2010 – n.68) um pouco da importância, para os judeus, do Beit Hamikdash - o Templo Sagrado - e talvez, a partir daí, possamos, conseqüentemente, vislumbrar um pouco melhor o que é ser Igreja.
   “A concepção de uma “Casa de D’us” – um local específico onde “habita” o Eterno – deve ser apreendida de forma metafórica, pois D’us preenche e transcende toda a Sua Criação. Como ensina o Midrash, “D`us é o lugar do mundo, e o mundo não é o Seu lugar”. Isto significa que tudo que existe, existe dentro d`Ele. De fato o Rei Salomão, referindo-se ao Templo que acabara de construir, declarou: “Os céus e os mais altos céus não Te podem conter, quanto menos esta casa que construí para Ti”. O propósito do Beit Hamikdash evidentemente não era o de conter o Infinito, mas o de servir como centro da manifestação Divina na Terra. Era lá onde a Shechiná, a Presença Explícita de D’us, revelava-se de forma aberta. No Templo de Jerusalém não havia ocultação Divina; não havia qualquer dúvida quanto a Sua Existência e Providência. Rabi Josué Dessihnin explica de que maneira o Infinito poderia estar numa moradia terrestre e, ao mesmo tempo, no mundo inteiro. Ofereceu, para tanto, o exemplo de uma caverna à beira-mar. As ondas entram na caverna e esta se enche; contudo isto não faz diminuir o mar. O mesmo vale para a Glória de D’us (Bamidbar, 12,4).
    Um dos ensinamentos do Midrash mais citados pelos místicos judaicos é que o propósito da Criação é que o homem construa uma “habitação” para D’us nas esferas inferiores – este mundo físico. Isto significa que D’us deseja sentir-Se “em casa” não apenas nos Céus – onde a Sua Presença é revelada abertamente – mas também em nosso mundo material, onde Sua Existência é oculta a tal ponto que muitos chegam a d’Ela duvidar ou negar. O homem constrói a moradia de D’us quando eleva este mundo físico para que se torne um lugar sagrado onde o Criador possa revelar-Se.
    A primeira Casa de D’us a ser construída – que servia como o protótipo do Templo Sagrado – foi o Mishkan, o Tabernáculo. Este foi construído no deserto do Sinai pelos Filhos de Israel, após o recebimento da Torá. Tamanha era sua importância que quase a totalidade da segunda metade do Livro do Êxodo trata de descrever seu aspecto e construção.
    O propósito do Tabernáculo era ser o microcosmo de toda a Criação, representando a parceria entre o ser humano e D’us para fazer do mundo um lugar onde Sua Luz Eterna pudesse ser abertamente revelada. De fato, a construção do Tabernáculo pelos Filhos de Israel simbolizava o próprio ato da Criação Divina.
    Além de terem sido ordenados a construir um Tabernáculo no deserto do Sinai, os Filhos de Israel receberam o mandamento de edificar um Templo permanente. Como escreve a Torá: “Ireis ao lugar que escolherá o Eterno, vosso D’us, dentre todas as vossas tribos, para ali por Seu Nome; pelo lugar de Sua morada perguntareis, e lá ireis” (Devarim, 12:5). Mas a construção do Templo não poderia ocorrer até que o Povo Judeu tivesse ocupado a Terra de Israel, apontando um rei sobre si e alcançado a paz com as terras vizinhas. Tal estado de paz foi obtido apenas durante o reinado de Davi. Este, após ter feito de Jerusalém a capital eterna do Povo Judeu, almejava, acima de tudo, construir ‘’a Casa de D’us”.
    Com a ajuda do maior profeta da época, Samuel, o Rei David procurou o local exato do Grande Altar e do lugar mais sagrado do Templo – Kodesh ha-Kodashim, o Sagrado dos Sagrados, que é “a moradia do Poderoso de Jacob” (Salmo 132: 2-5). No entanto, D’us não permitiu ao Rei David, Salomão, cujo próprio nome significa “a paz pertence a ele”, quem teve o privilégio de construí-la.
    No entanto, apesar de ter sido construído pelo Rei Salomão, um dos nomes do Templo Sagrado é a “Casa de David”, pois além de ter detectado o local onde deveria ser erguido, foi o Rei David quem reuniu todos os materiais para a sua construção. Todos os objetos de ouro que o Rei David adquiria em suas conquistas militares eram trazidos para Jerusalém e guardados para tal fim. Foi também David, o maior rei na história judaica, que escavou as fundações do Grande Altar do Templo e entregou ao seu filho, Salomão, o plano completo, com todos os detalhes, para a construção do Templo.
    A ligação eterna entre o Rei David e o Templo ficou evidente na própria inauguração do Beit Hamikdash. Quando o Rei Salomão tentou levar a Arca Sagrada para o Sagrado dos Sagrados, as portas fecharam-se hermeticamente e permaneceram fechadas apesar de ele ter recitado 24 salmos. As portas se abriram apenas quando Salomão pediu a D’us que Se lembrasse dos méritos de seu pai, David. Nessa hora, ele foi atendido e conseguiu colocar a Arca sobre a Even Shetiyá – a Pedra Fundamental do Universo. O Talmud afirma que a rocha é assim chamada porque é o alicerce do Universo – o ponto onde D’us iniciou toda a Criação. O Zohar, obra fundamental da Cabalá, descreve, metaforicamente, o início da Criação: D’us tomou uma rocha debaixo de Seu Trono de Glória e a jogou no abismo, separando assim as Alturas do mundo inferior.
    O primeiro Templo Sagrado, o majestoso edifício construído durante o reinado de Salomão, permaneceu de pé durante 410 anos. Para sua construção, foram empregados 150 mil homens que trabalharam durante sete anos. A tradição conta que durante sua construção ninguém sofreu acidentes, nem se quebraram ferramentas.
    Em 568 a.E.C, o Templo foi destruído pelos exércitos do rei Nabucodonosor, que o incendiou e saqueou, levando os judeus cativos para a Babilônia. Setenta anos mais tarde, um segundo Templo Sagrado foi construído, com a volta de judeus da Babilônia sob a liderança de Ezra e Neemias. Inaugurado em 516 a.E.C., o Segundo Templo foi reformado, em 20 a.E.C., pelo rei Herodes. Para expiar seu terrível pecado de ter assassinado a maioria dos sábios judeus, Herodes o transformou em uma das construções mais majestosas da época. Mas, no ano de 70 E.C., os exércitos romanos de Tito o destruíram. Os dois Templos foram destruídos na mesma data, 9 de Av, Tishá b’Av, o dia mais triste de nosso calendário.
    Tudo que se refere ao Beit Hamikdash é sagrado – a área do Templo, os pátios, as construções e as escadarias, assim como todos os objetos de seu interior. Tudo tinha uma razão de ser, um propósito e significado espiritual profundo. O projeto, em todos os seus detalhes, é uma espécie de projeção do mundo superior sobre o nosso mundo.(...)
    De fato, esse conceito de que o Altar servia de ligação entre D’us e o homem era conhecido mesmo antes da existência do Templo. O primeiro homem, Adan, foi criado no lugar onde seria erguido o Grande Altar, e para lá retornou após ter sido expulso do Jardim do Éden. Para tentar redimir seu pecado de ter comido o fruto proibido – que trouxe a impureza e o mal no mundo – Adan construiu, no lugar do Grande Altar, sobre o Monte do Templo, um altar para D’us. Foi para este mesmo local que Caim e Abel levaram suas oferendas. Destruído pelo Dilúvio, o Altar foi reconstruído por Noah, no mesmo lugar. Lá, seu filho Shem ofereceu os primeiros sacrifícios, e lá, D’us fez Seu primeiro pacto com a humanidade: nunca mais esta seria totalmente destruída por um dilúvio. O Altar tornou-se, portanto, um símbolo de proteção para todos os seres humanos.
    A localização do Altar foi revelada a Avraham durante seu último teste, o mais difícil de todos – quando recebeu a ordem Divina de levar seu filho, Itzhak, ao Monte Moriá, para o sacrificar. Ao se aproximarem de Jerusalém, pai e filho viram um anel de nuvens sobre o Monte do Templo e perceberam que esta era a montanha donde Adam e Noah haviam erguido o Altar para D’us. Ao se aproximarem ainda mais, uma coluna de fogo indicou sua localização exata. Avraham, então, reconstruiu o Altar, e se aprontou para sacrificar o filho. Mas D’us o deteve. Não obstante, o Talmud ensina que D’us considera como se o sacrifício de Itzhak tivesse, de fato, ocorrido. Este ato supremo de lealdade a D’us, por parte do pai e do filho, serve como fonte de proteção eterna para seus descendentes, o Povo de Israel.
    (...) A Torá conta que Yaacov, seguindo viagem para encontrar uma esposa, parou em Jerusalém, e aí adormeceu sobre uma rocha. Enquanto dormia, sonhou com uma escada, cujo topo atingia os Céus, e por onde anjos ascendiam e desciam. Isto indicava que o lugar onde se encontrava era o foco da elevação espiritual – o portal para os Céus através do qual uma pessoa pode subir a níveis espirituais mais elevados. Yaacov, ao acordar, percebendo que este era o ponto mais sagrado do mundo, colocou uma pedra como monumento e verteu óleo sobre a mesma. Mais tarde, tanto o Rei Davi quando Ezra e Neemias reencontraram o local exato para que lá pudesse ser iniciada a construção dos dois Grandes Templos.
    (...) Maimônides, o Rambam, descreve o Universo como contendo três níveis: a matéria não-refinada – a terra e as criaturas terrestres; a matéria refinada – as estrelas e os corpos celestes; e seres totalmente espirituais – os anjos e outros seres não-físicos. No âmbito do tempo, há também três divisões: os seis dias da semana, o Shabat e o “Shabat dos Shabats” – Yom Kipur, que é o dia mais sagrado do calendário judaico. Em relação às almas do Povo Judeu, há os Israelim, que, em sua maioria, eram fazendeiros, comerciantes, soldados e estadistas; os Leviim, cujo serviço no Templo Sagrado envolvia o refinamento e a elevação do mundo material; e os Cohanim, cujo líder era Cohen Gadol, o Sumo Sacerdote, que personificava o ápice espiritual alcançável pelo homem. Tanto no Tabernáculo quanto no Templo, esses três domínios eram representados, respectivamente, pelo Pátio, pelo Santuário e pelo Sagrado dos Sagrados.
    O Pátio englobava os elementos menos refinados do serviço do Templo. O Pátio era o lugar onde os Cohanim lavavam seus pés e suas mãos para se purificarem do contato com o mundo material antes de iniciarem o serviço. O Pátio era também onde eram abatidos os animais para os sacrifícios, onde a carne destes era consumida pelos Israelim, e onde as gorduras dos sacrifícios animais (representando a materialidade excessiva) eram queimadas no Grande Altar. Era também neste domínio do Templo que eram depositadas as cinzas que constituíam “os resíduos” da Menorá e do Altar interno, de ouro, onde era oferecido o incenso.
    O Santuário, onde apenas os Cohanim tinham permissão de adentrar, representava os elementos mais refinados do serviço do Templo. Era no Santuário que se localizavam a Menorá, a mesa onde era posto o Pão dos Cohanim e o Altar onde era queimado o incenso.
    O terceiro e mais sagrado domínio era o Sagrado dos Sagrados, que hospedava apenas a Arca sagrada e que podia ser adentrado apenas pelo Cohen Gagol e somente em Yom Kipur. Este domínio representava a trascendência do físico que é realizada pelo homem através de seu serviço a D’us.
    O Templo incluía esses três domínios porque a missão de construir uma Moradia para D’us nos mundos inferiores deve incluir todos os assuntos pertinentes à vida de um judeu. Este deve servir a D’us em seus momentos de grande exaltação espiritual – simbolizados pelo Sagrado dos Sagrados, em ocasiões em que é necessário trabalhar para elevar e refinar o mundo – correspondendo ao serviço no Santuário, e, finalmente, nas atividades mundanas do dia a dia – representadas pelo Pátio.
    As orações que se recitam nos dias de hoje correspondem ao serviço realizado no Templo Sagrado de Jerusalém. O povo judeu recita, diariamente, trechos a respeitos dos sacrifícios, oferendas e oferta de incenso.Vários tratados do Talmude abordam assuntos referentes ao Templo Sagrado e aos serviços nele realizados, e as principais orações do judaísmo, em particular a Amidá (Shemone Esre), incluem súplicas para que seja construído o terceiro Templo de Jerusalém, que será eterno. Jerusalém e o Templo Sagrado são continuamente lembrado.
    O costume de se quebrar um copo após a cerimônia de casamento serve para lembrar que a felicidade de um judeu não pode ser completa até que o Sagrado Templo volte a existir".
  
    Graça e Paz

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